Sociedade Treze de Maio
120 anos de História, 120 anos de Resistência
Fora dos roteiros turísticos, a Sociedade Treze de Maio guarda uma rica história sobre a formação da Cidade de Curitiba. O mito inventado de um Paraná Europeu, sem escravos e sem negros, e construído pela força imigrante persiste ainda hoje. Foi assim que a Praça do Japão, a Praça da Ucrânia, o Portal da Santa Felicidade, tornaram-se símbolos de uma sociedade de origem européia e branca.
Escondida atrás do Museu Paranaense, na Praça Generoso Marques, voltada para um comércio de flores e para a Praça Tiradentes, a estátua com pouco mais de 1,5m de uma negra carregando uma lata d’água, faz uma das poucas referências ao negro na cidade. Não é à toa que a Praça Zumbi teve destino certo. Esquecida no bairro do Pinheirinho, está localizada na periferia de Curitiba. Sina comum à comunidade negra e à própria Sociedade Treze de Maio, fadada ao esquecimento e à invisibilidade.
É comum escutar, inclusive nas escolas, que não houve escravidão no Paraná, ou que até houve, mas era uma escravidão “diferente”. De acordo com o sociólogo Octavio Ianni (*1926-2004+), a Escravatura em Curitiba, assim como o restante do país, foi a expressão completa do regime no Brasil, além de fator importante na composição da ideologia racial na cidade. Esse fator pode ser observado nos bens patrimoniais edificados. De acordo com a historiadora Cláudia Bibas do Nascimento, os afro-descendentes não possuíam bens materiais e patrimoniais e as políticas públicas deixaram de lado o patrimônio popular a fim de preservar os monumentos e os artefatos relacionados à imigração européia.
A principal construção que teve mão-de-obra negra, está situada no centro histórico de Curitiba, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, antes denominada “Igreja do Rosário dos Pretos de São Benedito”. Poucos sabem que bem próximo dali, existe mais um registro histórico: a Sociedade Treze de Maio.
Com a Abolição da Escravatura, os “africanos livres”, buscaram meios de sobrevivência na cidade. A criação de um Clube, uma Sociedade foi concretizada em junho de 1888. Mais tarde, passou-se a comemorar a fundação na data em que a Sociedade carrega no nome. Localizada numa região chamada de Boulevard São Francisco, habitada por negros, a Treze de Maio era ponto de referência para 99% dos libertos. Nela dividiam-se tarefas administrativas, convocavam reuniões, arrecadavam fundos, prestavam assistência aos irmãos necessitados, inclusive organizando enterros e funerais dignos, além de festas e outros eventos.
O historiador Edvan Ramos, que há 15 anos estuda a Sociedade, conta que na casa eram realizados festejos para N. Senhora da Conceição e S. Benedito. Havia também uma espécie de confraria feminina dentro da própria instituição, parte dela formada pelas lavadeiras que percorriam o Largo da Ordem. A mais famosa, Dona Maria Boeno, a santa da cidade, tem seu nome registrado em documentos da Sociedade Treze de Maio.
A partir da década de 50, a Treze de Maio abriu-se para novos sócios e começou a perder suas festividades religiosas e tradições. Reformada, perdeu suas características arquitetônicas, o que a impede hoje de ser tombada. Em 1996 a casa passou por nova reforma realizada pela Prefeitura, na qual “sumiram” quadros com fotografias, placas e uma mesa centenária.
Em 2006, o grupo de percussão Maracaeté iniciou seus ensaios dentro da Sociedade. Com o intuito de também gerar renda para a casa, o grupo organizou algumas festas. Duas delas caíram, coincidentemente, em datas que os associados prestavam homenagem a seus santos de devoção.
Com muita dificuldade, a Treze de Maio tenta preservar seu valor histórico. Sr. Álvaro da Silva, presidente da Sociedade, a qual seu pai também fora, batalha todos os dias para cobrir as dívidas da casa. Dívidas que se fazem, em sua maior parte, por conta do IPTU.
Neste 13 de Maio de 2008, a Sociedade completa 120 anos. Com a intenção de reavivar a memória curitibana, a comunidade está convidada a participar da programação tradicional em comemoração à data de Fundação. Com início às 17h00, Missa na Igreja do Rosário. Às 18h30, arrastão com o grupo Maracaeté até a Sociedade. Às 21h30, será realizada a Sessão Solene e às 23h00 o grande e esperado baile, com muito samba e alegria! O ingresso é de R$10,00. A programação está sujeita a alterações.
Um coração ancestral ainda está vivo e pulsa na Sociedade Treze de Maio.
SERVIÇO
Sociedade Treze de Maio – 120 anos de História
13 de maio de 2008
17h00: Missa na Igreja do Rosário
18h30: arrastão com o grupo Maracaeté até a Sociedade
21h30: Apresentação do grupo Maracaeté.
22h00: Sessão Solene
23h00: Baile: Samba de verdade para festejar!
R. Clotário Portugal, 274
A programação está sujeita a alterações.
Ingresso: R$10,00.
Info: 9905 3836 | maracaete@gmail.com
Produção: Brenda Maria e Flávia Cantero.
FONTES
PEREIRA, Marco Aurélio Monteiro. A Cidade de Curitiba no discurso dos Viajantes e Cronistas do século XIX e início do século XX.
LIMA. Carlos A. M. Um stablishment escravo? A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Curitiba (1793-1801).
MAMIGONIAN, Beatriz Gallotti. A abolição do tráfico atlântico de escravos e os africanos livres no Paraná através das fontes disponíveis no Arquivo Público do Paraná.
NASCIMENTO, Cláudia Bibas do. Presença negra na Lapa-Paraná: reconstruindo um passado através da cultura material.
COUTO, Isabel Cristina. Olhares da cidade: Curitiba e suas representações.
SILVA, Lúcia Helena Oliveira. Escravos e libertos no Paraná.
GUTIÉRREZ, Horacio. Donos de terras e escravos no Paraná: padrões e hierarquias nas primeiras décadas do século XIX.
ARQUIVO PÚBLICO DO PARANÁ. Catálogo Seletivo de Documentos referentes aos africanos e afro descendentes livres e Escravos. Coleção Pontos de Acesso. volume 02. 2005.
SILVA, Luiz Geraldo. Escravos e africanos no Paraná, 1853-1888: uma história inscrita nas possibilidades de um catálogo.
MEUCCI, Simone. Octavio Ianni em Curitiba: Os Dilemas e nexos entre Ciência Social, Ideais de Modernidade e Identidade Regional.
PEREIRA, Marco Aurélio Monteiro. A cidade de Curitiba no discurso dos viajantes e cronistas do século XIX e início do século XX.
MACHADO, Cacilda. Compadrio de escravos & paternalismo: O caso da Freguesia de São José dos Pinhais (PR), na passagem do século XVIII para o XIX.
(Todos os textos e arquivos estão disponíveis em páginas da Internet. Peço desculpas por não ter obedecido às Normas da ABNT, mas creio que a causa é mais importante.)
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